O filme é simplesmente espetacular. Em
suas metáforas visuais, com a mãe lavando o sangue, ou a tinta vermelha
que o representa, banhada em sangue, e, pelo menos para os mais
sensíveis, dá para notar a sensação de culpa que ela tem em relação ao
que o filho fez.
Dá a entender que ela não queria ter o
filho, e inclusive ela joga na cara da criança que ela era feliz antes
de ele nascer. Ela quebra o braço dele, mas Kevin não conta isso a
ninguém, ele diz que se machucou, inclusive para o pai e no hospital.
Kevin é uma criança que foge dos padrões
do que tanto a sociedade quanto a psicologia consideram “normais”: tem
tendências antissociais, é teimoso, birrento, sim, mas ele quer atenção e
amor. Especialmente da mãe. Em várias cenas vemos que ela desvia o
olhar dele. E olhar nos olhos é muito importante para criar laços de
afeto e confiança. Além disso, a mãe ignora o fato de que o próprio
filho exibe uma espécie de transtorno dissociativo de personalidade, vulgo, dupla personalidade,
com comportamentos distintos perante o pai e a mãe, e beirando a
crueldade com a irmã, que desde que nasceu é tratada como querida pelos
pais, ao contrário do que aconteceu com ele desde o início. Ele foi o
filho indesejado, ela não.
Um dos meus
momentos prediletos do filme é aquele em que o Kevin reflete sobre a
vida e começa a falar que as pessoas passam muito tempo vendo TV, e
mesmo em programas de TV, elas estão vendo TV! E vendo pessoas como ele…
"Não acha que eles trocariam de canal agora se eu tivesse tirado "A" em geometria?"
Pela definição de dicionários, pode-se
dizer que Kevin é um sociopata, já que um sociopata é definido como
sendo “uma pessoa com um transtorno de personalidade antissocial, que
exibe comportamentos tais, e que geralmente são resultantes de fatores
sociais e do ambiente que cerca o início de sua vida”, o que totalmente
se encaixa na situação do Kevin.
"Só porque você se acostuma com algo, não quer dizer que você gosta. Você se acostumou comigo."
Só que, ao contrário do que muita gente
pensa, a sociopatia não é sinônimo de psicopatia, e nem todo sociopata
mata. Pode sim levar a coisas mais graves como a psicopatia ou psicose
ou outros transtornos mentais, mas, se os pais tivessem analisado o
filho, não seria difícil de notar que não era uma criança que se
encaixava no que a sociedade considerada “comum”, “normal”. E nem na
adolescência tentaram remediar isso.
Na verdade, o pai do Kevin ajudou a
criar um “monstro”, como ele acaba sendo visto depois de seus atos
criminosos, embora a mãe seja julgada culpada por meio mundo…
especialmente ao ensinar o filho com tendências sociopatas a atirar com
arco e flecha desde criancinha.
"- Sempre que vejo gordos eles estão comendo... São gordos porque comem a comida errada, muito e o tempo todo.
- As vezes você pode ser meio dura. Me pergunto a quem eu puxei."
E, se a mãe era “infeliz” depois do
nascimento do Kevin, com a filha, ela agia diferente, com o maior
carinho… vejam bem, não estou defendendo os atos criminosos do Kevin,
estou apenas analisando (quase, pois renderia uma tese de mestrado uma
análise dessas…) a fundo a parte psicológica desse drama – que poderia
ter sido evitado se os pais abrissem os olhos e vissem que tinham um
filho com problemas e o levassem a tratamento desde criança. Foi mais fácil ensinar o Kevin a atirar com arco e flecha.
Embora o título, “curiosamente”, seja
“Precisamos falar sobre o Kevin”, em momento algum os pais realmente
“conversam” sobre o filho, e nem pensam em algo sério a fazer, nem
quando ele é criança, e nem adolescente. E o Kevin tentou se fazer ser
ouvido, mesmo de seu jeito “torto”, mas de nada adiantou. O título
parece uma zombaria justamente da falta de conversa! Era preciso
conversar sobre o Kevin… mas isso foi feito?
É trágico, lindo, triste… gera emoções
intensas, mas eu recomendo esse filme (e pretendo ler o livro também,
que já me disseram ser ótimo) às pessoas de mente aberta, sem julgarem o
Kevin como mero assassino que merece ser condenado, etc.
"- Quero que me diga o porquê.
- Eu achava que sabia. Agora não tenho tanta certeza."
Se os pais jogarem de lado vergonhas e preconceitos e levarem seus filhos com transtornos sociais a psicólogos, terapeutas, psiquiatras se necessário, desde crianças, tais horrores podem ser evitados. Mas o que mais pode evitar esse tipo de horror é algo tão simples que parece ter sido esquecido e que as pessoas falam da boca para fora, mas não o sentem: AMOR.
Fonte: http://www.icultgen.com.br/2013/06/26/review-analise-do-filme-precisamos-falar-sobre-o-kevin/
*Imagens de domínio público